domingo, 11 de dezembro de 2011

. Piaget e o Construtivismo



Piaget (1896-1980) constitui outro grande marco na história da Psicologia. Centrou a sua investigação no desenvolvimento intelectual das crianças, a quem aplicou diversos testes de inteligência, e pretendia responder a duas questões fundamentais: 1) Como se organiza e estrutura o conhecimento?; 2) Como se forma o pensamento?.


Em relação à primeira, operou uma síntese entre as teorias que se opunham na altura: o inatismo e o empirismo/behaviorismo. O inatismo defende que o conhecimento é determinado pelas capacidades herdadas dos progenitores, ou seja, é o sujeito que organiza ativamente os dados provenientes do meio. O empirismo, como vimos a propósito do behaviorismo, defende que o sujeito é uma espécie de tábua rasa onde se inscrevem as sensações que experimentamos, ou seja, o sujeito é passivo e limita-se a reagir aos estímulos provenientes do meio exterior. Piaget, por seu turno, defende uma perspetiva intermédia. Por um lado, precisamos de ser estimulados pelo meio exterior. Por outro, somos nós, com as capacidades que herdamos, que organizamos a experiência e que lhe conferimos um sentido. Daí que diferentes sujeitos façam leituras diferentes do mesmo objeto ou situação. A esta teoria, uma espécie de síntese entre inatismo e empirismo, deu-se o nome de construtivismo, porque o conhecimento é uma construção do sujeito em permanente relação biunívoca com o meio.


Em relação à segunda pergunta, depois de muitas experiências com os grupos de crianças com quem trabalhou ao longo da vida, Piaget conclui que o desenvolvimento intelectual se processa ao longo de quatros estádios, desde o nascimento até à adolescência, uma espécie de etapas num mesmo caminho ao longo do qual descobrimos capacidades diferentes. Quais as transformações que se dão em cada um desses estádios é o que veremos no segundo módulo quando nos dedicarmos mais detalhadamente às diferentes conceções do desenvolvimento.

domingo, 4 de dezembro de 2011

. A Psicanálise



O termo psicanálise é geralmente utilizado para designar a teoria freudiana sobre o psiquismo. No entanto, trata-se apenas de um método cuja finalidade é trazer à consciência as motivações inconscientes que estão na base das perturbações nervosas. Freud estava convencido de que trazer à luz do dia as recordações recalcadas e falar abertamente delas, isto é, trazê-las à consciência e enfrentá-las, seria meio caminho andado para nos libertarmos delas e tornar a cura possível. A estratégia, por isso mesmo, consistia em interpretar as manifestações do inconscientes - os sonhos e os atos falhados - e tentar compreender o seu real significado, o motivo por que causam dor psicológica. Trata-se, portanto, de um método assente no poder da palavra e numa relação de extrema confiança entre psicanalista e paciente, para que este último não tenha receio, ou qualquer outro tipo de constrangimento - vergonha, pudor...- quando é convidado a descrever os seus sonhos ou a fazer uma associação livre de ideias. A associação livre de ideias consiste em dizer tudo quanto ocorre à cabeça sem qualquer preocupação de fazer sentido, uma espécie de ditado do pensamento sem regras ou controlo, como se as ideias/imagens se sucedessem umas às outras como peças de um e mesmo quadro. O psicanalista, por sua vez, encarregar-se-ia de analisar essas imagens e, sobretudo, as ligações livres entre cada uma delas, por muito bizarras que possam parecer.

domingo, 20 de novembro de 2011

. O Inconsciente e o funcionamento psíquico segundo Freud



Depois de ter estudado com Charcot, que recorria à hipnose no tratamento das perturbações nervosas, e com Breuer, com quem aprofundou os seus cohecimentos, Freud abandona o trabalho em equipa e desenvolve a sua própria teoria sobre o funcionamento psíquico. Para o cientista austríaco era evidente que as causas da histeria, com sintomas físicos, só podiam ser de ordem psíquica, uma vez que os doentes não apresentavam nenhum problema a nível orgânico. Ora, se a origem desses problemas era psíquica e não havia consciência disso, para lá de psíquicas, as causas só podiam ser não conscientes. O mesmo é dizer, a causa da histeria estava no inconsciente.

E que é o inconsciente? O inconsciente, à semelhança do que se passa em nossas casas, seria uma espécie de cave onde vamos acumulando aquilo que já não serve ou que não é útil de momento. Neste caso estaríamos a falar de tudo quanto nos impede de estarmos bem connosco próprios e de acordo com o socialmente aceite: desejos sexuais considerados inaceitáveis, medos irracionais, fantasias, recordações que causam dor e impulsos violentos. Ou seja, para lá daquilo que controlamos - as percepções, os pensamentos, os conhecimentos -, e de que temos consciência, estaria uma série de energia acumulada, inconsciente, pronta a sair da cave e a surpreender-nos quando menos esperamos em forma de lapso - quando trocamos os nomes às pessoas, por exemplo - e de perturbação nervosa - a histeria e tantas outras -. Perceber como é que isso acontece é o que faremos de seguida.

Quando somos confrontados com impulsos e desejos que colocariam o equilíbrio indivíduo-sociedade em perigo, isto é, quando tendemos a manifestar pulsões e tendências perigosas e consideradas incorretas, há uma espécie de censor que nos diz isso mesmo: atenção! O que aí vem pode ser desastroso. Como numa discoteca, o porteiro decide quem está bem vestido e pode entrar e quem não corresponde ao perfil desejável. Nesse momento, uma vez mais como na discoteca, esses impulsos ficam à porta e acabam por se retirar, neste caso permanecer no inconsciente. A este processo que consiste em mandar para trás os impulsos reprováveis Freud chamou recalcamento, um processo normal de sobrevivência individual e social. Um processo que pode transformar-se num verdadeiro problema, no entanto, quando se dá demasiadas e repetidas vezes, sem que cheguemos a libertar a energia acumulada e que acaba por se manifestar contra a nossa vontade em forma de sonho - já pensaste de onde vêm as imagens bizarras dos teus sonhos? - ou de doença quando a repressão e a carga acumulada são excessivas.

Não é por acaso que o método inventado por Freud, de que falaremos nas próximas aulas, dá particular atenção à análise à linguagem dos sonhos. Precisamente por ser um momento da nossa vida psíquica em que o porteiro, isto é, a consciência que nos lembra o que podemos e não podemos fazer, está adormecido. O mesmo é dizer, por ser um momento em que realizamos todos os nossos desejos de forma livre, ainda que de forma simbólica, e que de outra forma poderiam estar na base de doença mental.

À zona onde toda essa energia se encontra acumulada Freud chamou ID, uma zona inconsciente que tende para a satisfação imediata dos desejos e pulsões. Uma zona, portanto, sem regras, sejam de lógica, que nos obrigam a fazer sentido, sejam morais ou sociais, que nos recordam o que deve ou não ser feito. O EGO é precisamente o contrário, é a zona consciente - segundo Freud substancialmente mais pequena - que se rege pelo princípio da realidade, em oposição ao princípio do prazer que rege o ID, e que se orienta por princípios lógicos e sociais. Numa palavra, decide quais os impulsos provenientes do ID podem ou não ser ealizados. Algures entre ambos, Entre ID e EGO, está o SUPEREGO, a zona psíquica que corresponde à interiorização das normas, dos valores sociais e morais, adquiridas ao longo do processo de socialização e que pressiona o EGO para controlar o ID. Uma zona, segundo Freud, que começa a manifestar-se entre o 3 e os 5 anos.

Quando o equilíbrio entre estas três zonas psíquicas (não se trata de localizações físicas, mente não é cérebro) é posto em causa, seja porque as situações recalcadas são demasiadamente traumáticas, seja porque o SUPEREGO não se manifesta, ou então se manifesta de forma excessivamente rigorosa, corremos o risco de desenvolver uma doença mental e/ou comportamentos considerados desviantes. Para lidar com esses casos, Freud inventou um método, a Psicanálise, que merecerá a nossa atenção nas próximas aulas.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

. Freud e a terceira ferida narcísica da humanidade: o inconsciente.



Depois de Copérnico, no século XVI, que invalida a hipótese geocêntrica e retira o Homem do centro do Universo, e das revelações de Charles Darwin, no século XIX, filiando a espécie humana numa raíz comum a outras espécies, Freud é conhecido por ter dado a machada final, já no século XX, na ideia que a Humanidade fazia de si mesmo: um ser criado por Deus, com estatuto especial entre os outros seres, e em pleno uso da sua vontade. E isto por uma razão muito simples: além da sua vontade, o Homem é movido por razões de que não tem consciência nem controla. Quer isto dizer que por detrás da consciência - as percepções, pensamentos e conhecimentos - existe uma dimensão mais profunda de que não temos consciência - o inconsciente - que interfere silenciosamente na vida de cada um de nós. Como é que Freud chegou a semelhante conclusão e como é que o inconsciente funciona, é o que veremos de seguida.

domingo, 6 de novembro de 2011

. Behaviorismo: a bela e o senão



Não há dúvidas que Watson deu um grande contributo para a definição do objeto de estudo da Psicologia e para o estudo do comportamento. Ainda assim, não está livre de críticas:

.trata-se de uma visão muito simplista de comportamento (estímulo-resposta), ignorando que os processos mentais dos seres humanos são muito mais complexos do que os dos animais

.substima os factores hereditários e o seu papel no desenvolvimento das respostas

.ignora que pessoas diferentes podem reagir de maneira diferente à mesma situação

.ignora que pessoas diferentes podem reagir de forma idêntica perante situações semelhantes


Para não falar do perigo que representa pensar que o comportamento humano é facilmente moldável, manipulável e controlável. Uma questão para discutirmos na aula...

. Pavlov, Thorndike e a sua importância para o behaviorismo

Como vimos, o estudo do comportamento animal foi determinante nas propostas de Watson. Além das que ele mesmo realizou com ratos e macacos, há outras experiências desenvolvidas por contemporâneos seus que estão na base das suas descobertas: as de Pavlov, um investigador russo que trabalhou no domínio da reflexologia, e as de Thorndike, que enunciou a lei do efeito.



Pavlov e a reflexologia

Pavlov desenvolveu experiências com cães sobre o funcionamento das secreções gástricas, o que lhe valeu o prémio Nobel, e distinguiu dois tipos de reflexos (respostas/reações): os reflexos inatos e os reflexos aprendidos ou condicionados. Os primeiros são comuns aos homens e animais, são imediatos e involuntários, como é o caso da salivação perante o alimento ou a reação à luz e ao som que nos surpreendem. Os segundos são aprendidos, ou seja, são respostas que desenvolvemos depois de associarmos diferentes estímulos, como acontece, por exemplo, quando vamos ver quem é quando ouvimos bater à porta. Para compreender a distinção entre uns e outros, o melhor é mesmo descrevermos a experiência que o celebrizou:

1. Pavlov mostra um pedaço de carne (E1) a um cão e este saliva (R1)

2. Pavlov associa à carne uma campainha (E1+E2) e o cão continua a salivar (R1)

3. Pavlov faz soar a campainha (E2) e o cão continua a salivar (R1)




O que aconteceu nesta experiência: depois de o estímulo não condicionado (a carne) ser repetidas vezes associado ao estímulo condicionado (a campainha), o cão aprendeu a reagir ao estímulo condicionado como reagiria naturalmente ao não condicionado.






Thorndike e a lei do efeito

Thorndike (1874-1949), norte americano, mostrou que há uma relação entre o estímulo e a resposta quando esta é acompanhada de recompensa. Inversamente também: se a resposta não é acompanhada de recompensa, ou até é acompanhada de punição, aquela relação enfraquece. Por exemplo: se colocarmos um gato dentro de uma gaiola que só abre depois de acionar um cordel, ao mesmo tempo que colocamos cá fora um prato de comida só acessível se a gaiola estiver aberta, depois de muitas tentativas e erros, o gato vai aprender a abrir a porta e a comer quando desejar. O processo é relativamente simples: depois de muitas tentativas frustradas e de se atirar às grades, por acaso, o gato aciona o cordel e tem acesso à comida, o que se repete por várias vezes até que o gato passa a associar o acionamento do cordel à abertura da porta. O que no princípio foi um acaso, e demorava imenso tempo a conseguir, tornou-se uma resposta aprendida, uma vez que o gato passou a demorar cada vez menos tempo para conseguir o pretendido. Ou seja, quando aprendemos a associar um comportamento (acionar o cordel) a uma recompensa (comida), o comportamento consolida-se tende a repetir-se (o gato aciona o cordel sem grandes hesitações). Quando, pelo contrário, um comportamento não é seguido de recompensa (o gato atira-se contra as grades e não consegue comida), ou é punido (o gato atira-se contra as grades e acaba por se magoar), o comportamento tende a desaparecer (o gato deixa de se atirar contra as grades). E não é assim com os humanos? Thorndike estava convencido que sim.



. Watson: a noção de comportamento e o papel do meio





Segundo Watson, o comportamento é o conjunto de respostas objetivamente observáveis aos estímulos provenientes do meio físico ou social. Um estímulo é qualquer coisa, ou situação, que provoca uma reação em nós, a resposta ao estímulo. Por exemplo, quando fecho os olhos porque alguém aponta uma luz na minha direção, a luz é o estímulo e o pestanejar a resposta. Watson estava convencido que se conhecermos o estímulo podemos prever a resposta, estabelecendo uma lei, à semelhança dos fenómenos naturais, que se repetem em circunstâncias semelhantes. Daí que também estivesse convencido de que se eu sujeitar um indivíduo a um determinado estímulo, ou conjunto de estímulos, posso produzir nele a resposta que eu desejar. Dito de outro modo: Watson estava convencido que é possível condicionar/treinar/ensinar comportamentos, ao ponto de ter afirmado que conseguiria transformar um grupo de crianças naquilo que ele mais desejasse: um ladrão, um juíz, um médico.... Realçando desta maneira o papel do meio na produção de comportamentos, na medida em que pessoas provenientes de meios diferentes, perante a mesma situação, reagiriam de maneira diferente também. Watson sabia que entre o estímulo e a resposta há uma séria de processos mentais, além dos aspetos hereditários que também interferem na construção da personalidade, mas considerava-os pouco importantes.


A ideia era estabelecer leis e fazer previsões, de modo a podermos moldar alguns comportamentos e a evitar a ocorrência de outros. Trata-se de uma ideia acertada no que diz respeito ao comportamento animal, mas perigosa, como veremos, no que diz respeito ao comportamento humano. Ainda assim, trata-se de uma ideia com muitos seguidores e que esteve na base de muitos projetos, da política ao cinema. Laranja Mecânica, por exemplo, um filme tão brilhante quão violento de Stanley Kubrick, é exemplo disso mesmo.

. Watson e o behaviorismo



Como vimos, a proposta de Wundt não está livre de críticas. É verdade que introduziu o método experimental na Psicologia, mas isso não foi suficiente para que alcançasse objetividade das outras ciências. Watson (1878-1958) foi o primeiro a reconhecer essa limitação e a tentar solucionar o problema. Inspirado pelos estudos no domínio da neurologia, que recorria a experiências com animais, e depois de se doutorar em neuropsicologia, deu aulas de psicologia animal. Defendeu que não há diferença entre esta última e a psicologia humana, pelo que o método a seguir deveria ser o mesmo: estudar o comportamento objetivamente observável, a única coisa que podemos observar diretamente, e não a consciência, apenas acessível pela introspeção. A esta ideia dá-se o nome de behaviorismo (como sabes, behavior significa comportamento em inglês), ou comportamentalismo: o objeto de estudo da Psicologia é o comportamento humano observável recorrendo ao método experimental.

sábado, 15 de outubro de 2011

. As limitações do método instrospetivo

Ainda que seja muito útil na vida de todos os dias - convém que paremos de quando em vez e nos ouçamos a nós mesmos -, a verdade é que como método científico a introspeção deixa muito a desejar. O maior problema é, desde logo, o seguinte: a objetividade requer distância, isto é, o observador deve poder olhar de fora para o objeto observado, de modo a poder vê-lo de todas as perspetivas e sem ideias prévias, o que não acontece quando fazemos introspeção, uma vez que o observador coincide com o objeto observado. E isto por uma razão muito simples: não podemos deixar de ser nós próprios, com as ideias que temos sobre nós mesmos, e observarmo-nos como se de um objeto exterior se tratasse. Além desta razão principal, o método instrospetivo revela outras fragilidades ou limitações:


1. só o sujeito da introspeção tem acesso à sua experiência interna, o que lhe "passa pela cabeça" não pode ser observado do exterior e ser controlado por outro observador;


2. nem todos os sujeitos conseguem descrever o que estão a sentir ou a processar mentalmente, isto é, a introspeção depende da linguagem;


3. as crianças, alguns doentes mentais, assim como os animais, não podem introspecionar;


4. há experiências psicológicas, como a ira que nos põe fora de controlo, que não são compatíveis com a introspeção: uma pessoa irritada nunca terá a calma necessária para descrever o que sente;


5. só analisa os processos conscientes, aqueles de que temos uma ideia. Isto é um problema porque os processos conscientes só são uma parte dos processos mentais, como veremos também existem processos inconscientes, e estes não são auto-observáveis, exatamente porque não temos consciência deles;


6. quando tomamos consciência de um estado psicológico já estamos a modificá-lo, trata-se já do modo como encaramos esse estado e não no seu estado puro. Em bom rigor, não há introspeção, mas retrospeção, uma vez que há um hiato entre o processo e a sua descrição.


William James, outro pioneiro da Psicologia enquanto disciplina autónoma, foi um dos primeiros a criticar o método introspetivo e a teoria de Wundt. Vê o vídeo que se segue, exatamente sobre o desacordo entre os dois investigadores:


. Wundt e o 1º laboratório de Psicologia Experimental



Nem sempre se pensou, como hoje, que a objetividade não é o mais importante em Psicologia. Quando esta se emancipou da Filosofia, de onde provinha, ainda não se falava de Ciências Humanas, e o modelo era o das Ciências Exatas. Estávamos nos finais do século XIX e o positivismo reinava, segundo o qual o conhecimento válido terá de ser rigoroso e objectivo. Daí que os primeiros investigadores se tenham concentrado nisso mesmo, aproximar a Psicologia dos métodos de trabalho das outras ciências. E isto implicava três coisas:


1. definir o seu objeto de estudo;


2. assegurar que o seu objeto de estudo pode ser estudado objetivamente;


3. utilizar um método rigoroso, o experimental, que garanta a objetividade.


O primeiro a investir neste sentido foi Wundt, médico de formação, que em 1879 fundou em Leipzig o primeiro Laboratório de Psicologia Experimental. Wundt considerava que o objeto de estudo da Psicologia era a consciência, que poderia ser decomposta nos seus elementos mais simples, as sensações, à semelhança das moléculas decomponíveis em átomos (a Química era a referência). Esta ideia de que a consciência e os processos mentais são uma associação de sensações, que depois poderão ser "observadas" isoladamente como se de átomos se tratasse, fez com que a sua teoria fosse conhecida por associacionismo.


Para isolar e registar as sensações de modo a estudá-las objetivamente Wundt recorreu ao método introspetivo. A introspeção é um processo relativamente simples a que recorremos todos os dias e muitas vezes sem pensar que estamos a fazê-lo: trata-se de nos "voltarmos para dentro de nós mesmos" e dar conta do que nos está a passar pela cabeça, que estamos a pensar ou a sentir... A diferença é que enquanto nós o fazemos espontaneamente, isto é, quando damos por nós estamos a pensar no que nos vai pela cabeça, Wundt o fazia de modo sistemático e controlado no seu laboratório: observadores treinados eram convidados a descrever as suas sensações face a uma situação experimental que ele próprio estabelecia. Por exemplo, pedia aos seus colaboradores que registassem de forma rigorosa e quantitativa, as sensações provocadas pela mastigação de um amendoim ou pela audição de sons repetitivos... como veremos de seguida, um método muito discutível!


quarta-feira, 5 de outubro de 2011

. A "Objetividade" na Psicologia




A objetividade é o sonho de qualquer ciência, mas isso nem sempre é possível! Claro que para um matemático ou físico isso não é um grande problema, o teorema de pitágoras e a lei da gravidade são uma evidência universal, mesmo que exista quem não queira acreditar nisso (há gente para tudo!), todos os corpos tendem para o centro da terra e assim continuará a ser (bom...às vezes os cientistas também se enganam!). Para um Psicólogo, porém, já o mesmo não pode ser dito. A Psicologia faz parta das chamadas Ciências Sociais e Humanas, isto é, aquilo que o homem é enquanto ser histórico - a sociedade do século XXI é diferente da sociedade medieval - e cultural - a cultura islâmica pouco ou nada tem a ver com a cultura nórdica - também lhe interessa. Quer isto dizer que a Psicologia não pode estabelecer leis universais, isto é, que valham para todos como acontece nas ciências exactas, uma vez que aquilo que somos individual e culturalmente interessa para compreender os nossos processos mentais e comportamentos - nascer e crescer numa tribo da amazónia não é o mesmo que crescer num condomínio privado de cascais -. Melhor: na Psicologia o ser humano é simultaneamente sujeito e objecto do conhecimento, e isso faz com que aobjectividade permaneça um sonho inatingível.

. Do "senso comum" ao "conhecimento científico"




Quando olhamos à nossa volta, às vezes sem nos darmos conta disso, registamos uma série de informações com o auxílio dos nossos orgãos sensoriais: visão, audião, tato, olfato e paladar. Ao conhecimento daí proveniente, mais aquele que herdamos culturalmente e vamos adquirindo ao longo do processo de socialização - as tradições, os hábitos, os costumes, os valores -, atribui-se o nome de senso comum. Um conhecimento superficial e subjectivo, portanto, além de relativo. Superficial, porque resulta do contacto directo com a realidade, baseado nos sentidos, na maioria das vezes sem tempo para pensar no que estamos a registar, trata-se de um registo passivo que não vai para lá das aparências. Subjectivo, porque resulta da percepção sensorial de cada um, isto é, varia de sujeito para sujeito em função das suas capacidades físicas, sem intervenção da razão. Relativo, porque as sociedades e as culturas são diferentes, organizam-se e assentam em regras diferentes, daí que varie de cultura para cultura e de sociedade para sociedade - o que é considerado correcto na cultura x não é necessariamente correcto na cultura y -.


Ainda que o senso comum seja muito útil para a vida de todos os dias - é importante poder sentir que está frio e vestir um casaco, é bom saber que serei socialmente reprovado se for nú para a rua -, a verdade é que este conhecimento não inspira muita confiança quando se trata de fazer ciência. Isto é, se eu estiver interessado em construir conhecimentos que possam servir todos os indivíduos por igual, não posso basear-me nos sentidos, que falham, mas na razão, igual em todos os seres humanos independentemente da cultura a que pertencem. Quer isto dizer que o conhecimento científico é metódico, universal e desejavelmente objetivo. Metódico, porque as observações da realidade são sistemáticas e previamente preparadas, conduzidas com método e interessadas, isto é, os cientistas sabem o que procuram, não se trata de um registo ocasional e sem ordem como se passa no registo dos sentidos. Universal, porque o conhecimento científico vale para todos de igual forma, ou seja, a ciência estabelece leis, tenta afastar-se das variações fisiológicas entre cada um e entre cada cultura - ao cientista interessa o que é o quadrado, figura geométrica com quatro lados iguais cujas diagonais se cruzam rigorosamente ao centro, e não a importância do quadrado na cultura x ou y - . Desejavelmente objetivo porque o investigador, quando observa e estabelece as leis científicas, deve tentar abstrair-se de si, isto é, pôr de lado aquilo que o torna um sujeito individual e cultural - as suas limitações físicas, os seus sentimentos, as suas convições e pessoais, os valores da cultura a que pertence -, de modo a que a observação seja um registo da realidade tão fiel quanto possível, daí também que se socorra frequentemente da tecnologia.

domingo, 2 de outubro de 2011

. A Psicologia e as outras ciências





A vastidão e complexidade do objeto de estudo da Psicologia faz com que tenha de socorrer-se do saber de outras áreas científicas. A Biologia, a Etologia, a Sociologia, a Antropologia, a História, a Medicina e a Informática, são exemplos disso mesmo:



1) A Biologia, nomeadamente as investigações no domínio da genética e dos sistemas nervoso, endócrino e imunológico, todos presentes na maioria dos nossos comportamentos;


2) A Etologia, ou seja, o estudo do comportamento animal, é importante porque permite perceber a influência da hereditariedade, da fisiologia e das condições ecológicas no comportamento humano enquanto primata que também é;



3) A Sociologia, ao estudar a importância dos grupos como factor de coesão social e o processo de socialização, permite compreender o peso dos factores sociais na produção dos comportamentos individuais;


4) A Antropologia, ao estudar as crenças e instituições, sobretudo o modo como variam de cultura para cultura, permite compreender o peso da cultura e dos valores na produção de comportamentos e na construção da nossa personalidade;



5) A História, entre outras coisas, permite compreender as mudanças que se vão dando nas mentalidades, o que tem naturalmente reflexos na vida de cada um enquanto ser histórico e do seu tempo;




6) A Medicina é importantíssima, uma vez que é ela que permite actuar quando os processos mentais que se convertem em problemas psicossomáticos, isto é, problemas mentais - psyche - com consequências na saúde do corpo - soma -.



7) A Informática é importante porque permite fazer um tratamento mais rápido e rigoroso dos dados obtidos nas mais diversas investigações. Para não falar da sua massificação, que veio alterar muitos aspectos da nossa vida profissional e social, o que não pode passar despercebido ao psicólogos.




Conclusão: o mesmo fenómeno pode ser estudado de múltiplas perspectivas - histórica, sociológica... - e a Psicologia socorre-se de todas elas, daí ser considerada uma ciência transdisciplinar.





. O objeto de estudo da Psicologia



O objeto de estudo de uma disciplina é aquilo a que essa área específica se dedica. No que diz respeito à Psicologia, uma ciência relativamente recente, não é diferente. Se fizermos uma abordagem etimológica da palavra, isto é, se formos ver o que a palavra psicologia significa, verificamos que a Psicologia é o estudo - logos - da alma ou espírito - psyché -. Mas isso é muito vago, porque o termo alma é ambíguo e pode significar muitas coisas diferentes. Hoje em dia, porém, os psicólogos preferem falar em mente, o que remete para algo de interior e invisível, como acontecia com a ideia de alma, e em comportamentos, esses visíveis. Ficando então estabelecido que a Psicologia tem como objeto de estudo os processos mentais - pensamento, emoção, sentimento, perceção, memória, inteligência, motivação... - , as atividades que envolvem processos mentais, como a aprendizagem, os comportamentos, parcialmente motivados por esses processos mentais - ler, chorar, andar, dormir... -, e todos os fatores que contribuem para a construção da personalidade - sistema nervoso, cultura, experiências pessoais -. Um objeto, portanto, muito complexo, e que por isso recorre ao saber de outras disciplinas.